Brasil começa a dar primeiros passos rumo à integração da IA na Educação 20/03/2025 - 15:06
A popularização das inteligências artificiais (IAs) fez alunos e professores incorporarem a tecnologia com a rotina de estudos. O Brasil possui o primeiro território do continente americano a implementar o ensino de inteligência artificial na educação básica, segundo dados da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Em Teresina, no Piauí, a disciplina é obrigatória aos alunos do 9º ano do ensino fundamental até o terceiro do ensino médio, desde o início de 2024.
As plataformas mais populares como ChatGPT e DeepSeek são baseadas em IA generativa, ramo que cria novos conteúdos — como textos, imagens, músicas, vídeos e áudios.
No Paraná, a plataforma Aprendiz Inteligente, que utiliza IA generativa, começa a ser implementada nas escolas do estado. A Companhia de Tecnologia da Informação e Comunicação do Paraná (Celepar), em parceria com a empresa sul coreana RIIID, viabilizou a importação da solução para a rede de ensino paranaense.
“A tecnologia cria questões para estudantes e, a partir dos acertos e erros, gera um diagnóstico de quais conteúdos foram bem compreendidos e quais precisam ser revisados”, explica Gustavo Garbosa, diretor-presidente da Celepar.
A ideia é que a plataforma funcione como um complemento das avaliações e do acompanhamento dos alunos, a tecnologia já está em período de testes em dez Centros Estaduais de Educação Básica para Jovens e Adultos (CEEBJA) do estado.
Solange Regina Valente, 54, é diretora do CEEBJA Paulo Freire que participou das fases de teste da tecnologia. A educadora afirma que a IA pode ser utilizada por qualquer componente curricular e em qualquer etapa do ensino, o que possibilita um melhor diagnóstico da aprendizagem, por parte do professor.
“É possível entender melhor o nível de conhecimento de cada um sendo de grande auxílio na educação, onde em uma sala de aula encontramos vários níveis de aprendizagens e conhecimento, vejo na plataforma muito potencial de auxílio aos nossos alunos e educadores”, diz Solange.
E como as escolas estão lidando com o crescimento da tecnologia?
Em 2024, a pesquisa “Perfil e Desafios dos Professores da Educação Básica no Brasil” foi publicada pelo Instituto Semesp”. O estudo foi feito com docentes de redes públicas e privadas , do ensino infantil ao médio, de todas as regiões do país. Segundo o levantamento, 74,8% dos professores concordam parcial ou totalmente com o uso da tecnologia e inteligência artificial no ensino. Entretanto, apenas pouco mais de um terço, 39,2%, dos entrevistados disseram que sempre utilizam a tecnologia como ferramenta de ensino. Luciana Trento Pasquali é professora do colégio estadual Duque De Caxias, de Curitiba, e afirma não utilizar plataformas de IA diretamente na rotina de trabalho.
“Como ferramenta de pesquisa, me ajuda muito, mas não produzo matérias a partir dela e não aplico na sala de aula”, conta.
No entanto, os alunos de Luciana utilizam as plataformas de IA disponíveis.
“É preocupante quando o professor não está por perto. Já tive alunos que entregavam bons trabalhos, mas quando tinham que articular um texto em uma prova, por exemplo, tinham muita dificuldade”, alerta a professora.
Patricia Maillard, pesquisadora da Universidade Federal do Paraná e especialista em Inteligência Artificial aplicada à educação. alerta que essa “ilusão de competência” — ou seja, quando o aluno não aprende o conteúdo e apenas reproduz materiais de IA — pode ser perigosa entre os mais jovens. Apesar disso, ela afirma que o papel do professor na resolução desse problema é central.
“É preciso que o educador ensine e ajude o aluno a identificar os males do uso indiscriminado da IA”, diz. “Além disso, podemos desenvolver ferramentas inteligentes que regulam o que exatamente ‘essa IA generativa’ vai dizer para o estudante, baseado no que o discente sabe”, completa
Os professores podem ser substituídos?
O receio pela substituição do trabalho humano por máquinas cresceu em diversas áreas, na era das IAs. O professor William Marques, professor do Colégio Estadual João de Faria Pioli, em Maringá, utiliza o ChatGPT na sua rotina e relata que alguns colegas de profissão são resistentes à plataforma.
“Acho que veio para ficar e não há o que fazer, então devemos nos adaptar para que seja integrado da melhor forma”, diz.
Patrícia Maillard também menciona experiências desse tipo. “Já trabalhei em escolas em que aplicávamos sistemas para gerenciamento de conteúdos escolares, por exemplo, e alguns professores tinham uma certa resistência em testar as plataformas, por conta desse ‘medo’ de serem substituídos”, conta.
No entanto, a pesquisadora reforça que há estudos que apontam mais eficiência no aprendizado, quando a tecnologia é utilizada em parceria com o professor. Em 2018, um artigo publicado na 19ª Conferência Internacional sobre Inteligência Artificial na Educação, realizada em Londres, descobriu que apresentar aos professores análises em tempo real sobre o aprendizado, metacognição e comportamento dos alunos teve um impacto positivo no aprendizado das turmas, em comparação com o suporte de monitoramento feito somente na sala de aula.
Para que a inclusão das inteligências aconteça de maneira ética e segura, Patricia defende um processo cauteloso, com políticas que viabilizem infraestrutura e regulamentação
“Assim como investem em compras de livros para os colégios, está na hora dos governantes começarem a adquirir soluções inteligentes para o desenvolvimento da educação”, argumenta.